O PAI DO VENTO

Deslizador - era assim chamado o pequeno barco com motor de popa, usado à larga pela população do Alto Solimões. Havia também o batelão, mas este era um barco bem maior e equipado com um motor de centro.
Os deslizadores, em comparação com os batelões, eram bem mais velozes. Por isso, havia quem os chamasse de voadeiras, o que representava um certo exagero.
Pois bem, com qualquer nome que fosse designado, o pequeno barco sempre proporcionava um passeio bastante agradável. Numa viagem entre o distrito de Tabatinga e a sede do município, Benjamim Constant, o passageiro do deslizador podia apreciar as cenas da floresta, com os borrifos da água do rio Solimões a lhe refrescar o rosto... E até desejando não chegar logo ao local de destino, o que acontecia com cerca de meia hora de viagem.
Presume-se que esse tipo de desfrute não tenha acontecido ao Coronel Paxiúba. Homem bilioso, arrogante e sempre de mal com a vida, o militar estava chegando ao Hospital de Guarnição de Tabatinga para uma visita de inspeção.
Trazido por “Seu” Chico, cuja principal característica era chegar mudo e sair calado, o funcionário que era encarregado de pilotar os deslizadores do hospital.
Uma cena para não esquecer jamais. O coronel, assim que a embarcação encostou na margem fluvial, no que  ele procurou pisar em terra firme... um dos pés mergulhou nas águas barrentas do rio. E sendo esse incidente justamente o fermento que faltava para fazer crescer o mau-humor do coronel.
Na ribanceira, onde nos encontrávamos para recebê-lo, passamos todos a temer pelo pior. Antes de chegar o coronel, que também era médico, já ali sabíamos de sua reputação de ser um chato de coturnos. Paxiúba era alguém cujo único prazer consistia em atazanar o próximo. Com a hierarquia em seu favor, imagine os dissabores por que passaríamos no hospital militar, logo mais.
Correspondendo à fama, a fera esquadrinhou cada canto do hospital em busca de sujeira, testou cada peça do centro cirúrgico a ver se funcionava, abriu e fechou torneiras, clicou interruptores, analisou portas e paredes. Sempre aos resmungos, e sem dizer em que ele poderia nos ajudar em sua esfera de competência.
Como não há mal que sempre dure, o coronel deu por encerrada a inspeção e foi embora.
Soubemos depois, em Manaus, algo mais a respeito do Coronel Paxiúba. A história de que, tempos atrás, ele andara espalhando, no Comando Militar, a informação de que a esposa estava grávida. Tudo falso, porém. E, por não passar de um caso de flatulência, esse flato fato apenas lhe rendera o apelido de Pai do Vento.
Por conta desse desfecho, é que ríamos muito no Hospital de Guarnição de Tabatinga a cada vez que o nome do mau-humorado coronel era lembrado.
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ALTO SOLIMÕES, QUARTO DE EMPREGADA E PIUM E CARAPANÃ.

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