A GRATIDÃO DO CAJUEIRO

Rogaciano Leite
Mais de setenta anos marcam hoje a distância do dia em que uma garotinha humilde plantou com a sua "mão ingênua e mansa" uma exuberante castanha de caju nas areias cálidas de Aracati. Naquele gesto havia beleza e carinho, mas nunca, talvez, a esperança de que em futuro muito remoto aquela semente se transformasse em fronde acolhedora, com folhas cariciosas, gordos e saborosos frutos para premiar com a sua gratidão vegetal a mão frágil e pobrezinha que a plantara.
Diferente da ingrata amendoeira de Raul de Leoni, que "ergueu os ramos pelo muro em frente e foi frutificar na vizinhança", o cajueiro plantado pela então garotinha de Aracati, soube reservar todas as suas energias criadoras para fazer com que a hoje velhinha que o plantou recebesse do sr. Ministro da Agricultura um prêmio de dois mil e quinhentos cruzeiros pelo maior caju produzido naquela cidade, por ocasião da festa que o dinâmico deputado Ernesto Gurgel Valente organizou e dirigiu.
E a velhinha, que jamais em toda a sua vida houvesse pegado em tão "volumosa" importância, mandou, com esse dinheirinho, substituir por paredes mais sólidas e telhas de barro a palhoça que vinha ameaçando ruir sobre uma atormentada e esquecida existência de 70 anos.
E talvez a velhinha morra numa estação do ano em que o cajueiro agradecido possa cobrir de flores a mão que o plantou.
Quanta gente, neste mundo, precisaria ter a gratidão do cajueiro de Aracati.
Fonte: Gazeta de Notícias (CE), 11 de janeiro de 1957. Esta crônica foi lida e transcrita nos Anais da Assembléia Legislativa.
Via: http://www.facebook.com/centenariorogaciano.leite.1

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