O ANÍSIO - PEIXADA

Nas noites das segundas-feiras, após retirar-se o último cliente, Aquino abria o seu consultório odontológico para os amigos. E nós - um pequeno grupo formado pelo anfitrião, que tocava uma sanfona de botão, os médicos Wilson Medeiros, Emanuel Melo, Lucíola Rabelo, Rose Mary da Silveira, Sônia Almeida e por mim, que comparecia com o violão-, ali nos reuníamos para cultivar a boa música brasileira.
Por vezes, tivemos convidados. Como o pianista e compositor cearense Petrúcio Maia, o matemático Oswald de Souza e o violonista e compositor Luiz Sergio Bezerra. O Petrúcio havia sido meu colega no Colégio Batista, era irmão do LPM Maia, um consagrado autor de livros escolares de Física, e criara canções belíssimas como "Dorothy Lamour" (c/ Fausto Nilo), "Cebola Cortada" (c/ Clodo), "Lupiscínica" (c/ Augusto Pontes), entre outras. O Oswald de Souza era o celebérrimo Oswald de Souza do programa "Fantástico", o homem que calculava as probabilidades de acertos na loteria esportiva. Na noite com Oswald, o grupo mudou o local da reunião para o "Bar do Anísio", na Av. Beira-Mar. Tendo como cicerone em Fortaleza o colega Emanuel, o matemático foi logo declarando-se fã de Fagner e Belchior. Pena que o "Assum Preto" (cuja presença no "Anísio" era de alta probabilidade) não tivesse aparecido por lá para dar um reforço na "canja".
Mas o que era o "Bar do Anísio", senão aquele espaço libertário que os intelectuais, músicos e boêmios de Fortaleza gostavam de frequentar nas décadas de 1970, 1980 e tal?
Anísio, que tinha sido ascensorista do Edifício Diogo, era o proprietário, relações públicas e, por vezes, garçom da casa. Ele estava sempre disponível para um carteado com os amigos. Dona Augusta, sua esposa, era uma exímia cozinheira, e a biquara frita que ela fazia ficava uma delícia. Foi lá onde eu comi o melhor camarão ao molho da minha vida. E o restaurante foi palco de versões do concurso "Garota Cultural", que muitos desavisados levavam a sério. Tempos depois, o agitador cultural Claudio Pereira, em sua "cadeira voadora", de freguês se tornaria vizinho do casal.
Colhi estas outras informações no Blog Fortaleza Nobre:
O Bar do Anísio ficava na parte da frente da casa. Na cozinha Dona Augusta fazia delícias gastronômicas para os fregueses e também as refeições da família."Da cozinha para frente era o bar. Para trás era a casa. Mas a nossa casa era tudo, porque a gente vivia mais no bar do que na casa", lembra Nísia, filha do casal. Várias canções de Ednardo foram compostas por lá: "Carneiro"(c/ Augusto Pontes), "Alazão" (c/ Antonio José Brandão) e "Beira-Mar". Também a canção "Cavalo Ferro", de Fagner e Ricardo Bezerra. E a célebre  "Mucuripe", de Fagner e Belchior, foi mostrada pela primeira vez ali. 
Descrição da foto: 
A fachada da casa-bar do Anísio, ainda sem o famoso letreiro "O Anísio - Peixada". Dona Augusta parece fitar a imensidão azul de onde vêm os frutos do mar. Gaiolas penduradas em vários pontos (com campina, graúna, sabiá, golinha, bigodeiro...) denunciam que Anísio tinha o passatempo de criar passarinhos. Não sei como eles (os inhos pássaros) conseguiam dormir à noite com aquela cantoria dos boêmios.

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