Ontem liguei para minha mãe. Queria ouvir a sua voz.
Mas não era ela.
A demência tem ganhado terreno.
A voz ainda era firme, amorosa. O mesmo sorriso. Mas não era ela.
Somos um candelabro de luzinhas — milhares delas, coloridas.
Umas vívidas, outras desbotadas.
A cada dia, uma ou duas se apagam.
Há dias que resistem. Dão esperança.
— Lembra daquele dia em que a Laika mordeu o carteiro? — perguntei.
Mordeu lá. Bem naquele lugar onde se pendura a masculinidade.
Ela não lembrava.
Sua despedida começou aos 98.
Em setembro, fará 100. Mas não será ela.
Vive ainda iluminada nos filhos, nos netos, nos amigos — enquanto as luzinhas destes brilharem.
Mas luzinhas não brilham para sempre.
Outros candelabros virão com aquele brilho da nascença, e o mundo permanecerá iluminado.
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