CAMPOS DE CONCENTRAÇÃO NO CEARÁ

As secas no Nordeste são um fenômeno natural característico da região, marcada pelo clima semiárido, com altas temperaturas, baixa precipitação pluviométrica e escassez de rios perenes.
— sobretudo na área conhecida como "Polígono das Secas", a mais habitada das regiões semiáridas do mundo.

Em 1915, o Nordeste foi assolado por uma grande seca, que resultaria em mais de 100 mil mortes. Temerosa de que as cenas de 1877 se repetissem, a elite pressionou o governador Benjamin Barroso para não permitir que os retirantes perambulassem pelas ruas de Fortaleza.
Citando o risco de saques e invasões para justificar a medida, o governo cearense ordenou a construção do 1.º campo de concentração do estado — o Campo do Alagadiço, em Fortaleza, que serviu ao confinamento de 8 mil flagelados, vistos como uma "ameaça à ordem social".
O sofrimento no campo do Alagadiço motivou a escritora Rachel de Queiroz a publicar "O Quinze".
Em 1932, uma seca ainda mais severa se abateu na região. O governo do Ceará, então sob comando de Roberto Carneiro de Mendonça, retomou mais uma vez a estratégia de erguer campos de concentração para aprisionar os retirantes — agora em larga escala e com apoio federal.
Foram erguidos 7 novos campos de concentração nas cidades de Fortaleza, Senador Pompeu, Crato, Quixeramobim, Cariús, Quixadá e Ipu. Os recursos foram fornecidos pela Inspetoria de Obras Contra as Secas do governo Vargas.
Os campos eram estrategicamente erguidos próximos às linhas férreas, para interceptar os retirantes antes que chegassem a Fortaleza. Oficialmente, 90 mil flagelados foram aprisionados nessas instalações, mas alguns historiadores acreditam que a cifra seja muito maior.
Os campos eram oficiosamente chamados de "currais", explicitando a intenção desumanizadora da iniciativa. Os retirantes eram literalmente tratados como animais, que deveriam ser mantidos confinados para não incomodar os ricos com sua "miséria, sujidade e caos".
As taxas de letalidade eram muito elevadas. No campo de concentração de Patu (1932), localizado em Senador Pompeu, estima-se que 12.000 dos 20.000 prisioneiros pereceram. O número exato de mortos é desconhecido, uma vez que os campos não emitiam certidões de óbito.
Nas décadas seguintes, o poder público trataria de apagar os vestígios dos "currais" e ignorá-los nos livros didáticos.
No Sertão cearense, a cidade de Senador Pompeu abriga as ruínas do único campo de concentração que não foi demolido — o Campo de Patu (foto).
A população da cidade se empenha em manter viva a memória dos horrores praticados no local. Desde 1982, a comunidade organiza a Caminhada da Seca, para relembrar os que pereceram no cativeiro. A marcha percorre 4 km, do centro da cidade até o Cemitério da Barragem, erguido em torno das valas comuns onde mais de mil pessoas foram enterradas. Nesse local, junto a uma grande cruz, os populares deixam dezenas de garrafas de água como oferendas às almas das vítimas da seca, da negligência e da perversidade das elites.
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