ORMUZ BARBALHO SIMONETTI (*)
Em 1595, chegou ao Brasil o corsário francês TOUS-SAINT GURGEL, capitaneando algumas naus, com o propósito de realizar contrabando de madeira de lei, principalmente o pau-brasil. Nessa época ainda havia lutas de portugueses com franceses que se refugiaram em Cabo Frio, remanescentes do sonho de Nicolas Duran de Villeganion, em fundar em território brasileiro, mais precisamente onde hoje se localiza a cidade do Rio de Janeiro, a sonhada França Antártica. Essa região havia sido escolhida porque era habitada pelos temidos índios Tamoios e Tupinambás, que eram evitados pelos portugueses devido a sua ferocidade e hostilidade.
Nascido em Alsácia, a leste da França, junto às fronteiras da Alemanha e da Suíça, Tous-Saint era filho de pai alemão da Baviera e mãe francesa. Era homem letrado, pois havia estudado no Liceu do Strasbourg, em Paris. Em Saint Malo, na Normandia Francesa, concluiu o curso de Hidrografia e Ciências Náuticas.
No vigor de seus 25 anos de idade, e com grande experiência no comando de navios, visto já ter navegado por todo o Mediterrâneo, desembarcou na região de Cabo Frio onde esperava ganhar dinheiro fácil, negociando com traficantes franceses e holandeses que habitavam aquela região e oportunamente realizando pilhagem em outras embarcações que por ali navegavam.
Pouco tempo depois de sua chegada a Cabo Frio, o corsário teve que enfrentar forças enviadas pelo então governador do Rio de Janeiro, Salvador Correia de Sá, sob o comando do coronel João Pereira de Souza Botafogo, encarregado de desalojar os franceses daquela região. Travou-se uma feroz batalha que culminou com a prisão de Tous-Saint Gurgel, em que a frente de marinheiros franceses e alguns tamoios lutaram até o fim. Com um número bastante inferior de homens e armas, logo foi feito prisioneiro, não obstante ter lutado com toda bravura, despertando admiração e simpatia do coronel Botafogo, que logo se afeiçoou àquele valente aventureiro.
Trazido para o Rio de Janeiro, ficou encarcerado por algum tempo e, com a ajuda do seu captor, que gozava de grande prestigio com o Governador, conseguiu ficar na cidade do Rio de Janeiro por menagem. Tempos depois conseguiu a liberação de suas naus e tripulantes, aprisionados juntos com ele em Cabo Frio, e passou a dedicar-se a pesca de baleias na baía da Guanabara.
O cetáceo, muito freqüente nos meses frios, era capturado com facilidade e sua carne vendida no comércio local. O azeite as barbatanas e a gordura exportados para o Reino, rendiam um bom dinheiro nas terras d'além-mar. Sempre contando com a proteção do coronel Botafogo, participou de diversos negócios, ganhando bastante dinheiro, e em pouco tempo torna-se um homem muito rico.
Em janeiro de 1598 casou-se com a brasileira, Domingas de Arão Amaral filha do casal lusitano D. Antônio Diogo do Amaral e Micaela de Jesus Arão. Nascia naquela ocasião, e posteriormente através de seus descendentes, a família "Gurgel do Amaral" ou "Amaral Gurgel". Tiveram oito filhos sendo sete filhas e um varão, nascidos e registrados na Sé, entre 1607 e 1619.
A primeira filha do casal chamava-se Maria do Amaral Gurgel (1607/1671) que casou-se duas vezes. A primeira com Antônio Ramalho e tiveram cinco filhos. Em segundas núpcias, casou com Diogo da Fonseca e foram pais de quatro filhos, sendo dois homens que se tronaram padres e duas mulheres.
O segundo filho chamava-se Francisco do Amaral Gurgel que tornou-se religioso e ordenando-se padre. Era comum nas famílias mais abastarda da época a escolha de um dos filhos para seguir a carreira religiosa. Nasceu em 1610 e faleceu em 17.09.1654, na cidade do Rio de Janeiro.
A terceira filha do casal, Isabel do Amaral Gurgel, nasceu no Rio de Janeiro em 1613. Casou-se com Claudie Antoine Besançon, nove anos mais moço que ela, nascido na França, em 1604. Não temos registro de filhos do casal.
Ângela do Amaral Gurgel (1616/1695), a quarta filha do casal, casou-se com o português capitão João Batista Jordão. O casal teve sete filhos entre os quais Cláudio Gurgel do Amaral, que se ordenou padre depois que ficou viúvo e já com bastante idade.
A quinta filha do casal, Barbara Amaral Gurgel, nascida em 1617, casou-se com João Nogueira e tiveram diversos filhos, entre eles um chamado Bartolomeu.
Já a sexta filha do casal, Antônia do Amaral Gurgel, nascida em 1619, casou-se duas vezes: a primeira com João de Azevedo Roxas e tiveram cinco filhos, entre eles um padre de nome Francisco do Amaral Roxas. Em segundas núpcias, casa-se com o capitão Antônio Rodrigues Tourinho. Não temos registro de filhos desse casal.
E a sétima filha, Méssia do Amaral Gurgel, falecida em 1687, casou-se com José Nunes da Silva e tiveram quatro filhos entre eles o frei Antônio de Santa Clara. E, por última, Domingas do Amaral Gurgel que faleceu em tenra idade.
Quando morreu em 1651, já viúvo, aos 84 anos de idade, além dos filhos, netos e bisnetos gerados a partir de sua esposa Domingas de Arão do Amaral, deixou também vários descendentes mestiços, nascidos de suas constantes viagens pelo interior, onde passava várias semanas caçando e pescando, sempre acompanhado por amigos, escravos e índios mansos. Por ocasião de sua morte, os descendentes do seu casamento já somavam mais de uma centena e se espalhavam pelos estados de São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro e Bahia.
(*) Ormuz (foto ao lado) é presidente do Instituto Norte-Rio-Grandense de Genealogia e membro do IHGRN e da UBE-RN. E o presente trabalho está sendo aqui publicado sob sua permissão.