FERNANDO GURGEL: DE GRUMETE A CAPITÃO DE INDÚSTRIA!

A segunda-feira última (12/02/2001) assinalou a irreparável perda para as classes produtoras, igualmente representadas por trabalhadores e empresários, que almejam o progresso de nosso torrão cearense. O passamento do Sr. Fernando Nogueira Gurgel, após longa enfermidade, que pôs à prova toda a sua resistência e tenacidade, características de seu ímpeto em dobrar às dificuldades e de apego à vida, é fato que deve ser lamentado por todos que o conheceram.
Da infância tolhida, marcada pela orfandade paterna, teve a sua criação inicial aos cuidados de D. Dulce - um doce de pessoa até no nome que portava – que, apesar de sua viuvez, agravada pela adversidade econômica, soube bem conduzir e educar a prole herdada, incutindo nos filhos alguns dos mais caros princípios cristãos: fé, esperança e caridade. A bondade de sua mãe e a forma carinhosa com que acolhia como irmão a quem a procurasse, traços relevantes de sua personalidade, talvez expliquem a aquisição de notórias qualificações do Sr. Fernando: a solidariedade, a gratidão e a generosidade, esta principalmente com os mais necessitados.
Dadas às limitações orçamentárias de uma família abatida pelo desaparecimento do provedor-mor, na década de quarenta, em tais situações, as alternativas naturais adotadas pela população fortalezense para “preparar” seus rebentos para o futuro eram encaminhar as meninas para a nupcialidade antecipada e os meninos para seminário e forças armadas. Dessa forma, era ainda um pequeno adolescente, vivendo em Fortaleza com o seu avô Riquet, quando engajou como Aprendiz de Marinheiro; no entanto, foi curta a sua permanência por problemas de adaptação, porém esse desencontro não foi empecilho à sua transformação mais tarde em grande Amigo da Marinha.
Os entraves financeiros empurraram-no para o trabalho precoce, levando-o a interromper seus estudos escolares. Durante muitos anos, labutou na Siqueira Gurgel, em diversas funções subalternas, onde demonstrou um especial talento para vendas. A experiência granjeada e a invejável disposição para o trabalho concorreram para alimentar seu sonho de ter seu próprio negócio.
Com efeito, aproveitando as oportunidades surgidas, ergueu a MECESA, consolidada com muito esforço à conta da indômita capacidade de trabalho, do tino gerencial e da concepção estratégica de seu fundador.
A MECESA é merecedora de destaque nos dois fatores de produção: o capital e o trabalho. Sob o primeiro prisma, tornou-se uma empresa inovadora e renovadora, pois, com sua tecnologia de ponta, revolucionou a indústria metalúrgica cearense, sendo exemplo para o país em seu ramo de atuação; sob o segundo enfoque, ocupou posição de vanguarda por sua preocupação com o bem-estar de seus empregados, consubstanciada na oferta de refeições em restaurante modelo, na prestação de serviços sociais e no funcionamento de serviço de higiene, segurança e medicina do trabalho, propiciando benefícios mesmo antes das disposições trabalhistas determinarem a sua vigência.
Sr. Fernando era muito querido por seus funcionários, aos quais tratava com urbanidade e respeitosamente, tanto que mais de uma dezena deles se prontificaram, voluntariamente, para ceder um rim quando necessitou ser submetido à cirurgia de transplante renal.
Inúmeras foram as honrarias recebidas em sua vida, contudo, uma das mais singelas e que talvez possa ser a maior delas, decorreu de sua motivação para a concessão. Trata-se da Placa de Prata do Centro Médico Cearense, conferida em outubro de 1993, em reconhecimento à doação que fez de equipamentos e material necessários à montagem do Setor de Transplante Renal do Hospital Geral de Fortaleza, unidade que já realizou cerca de quatrocentos transplantes e beneficiou indiretamente milhares de familiares, envolvidos na rotina dependência das máquinas de diálise renal; seguramente, este configura um dos maiores débitos da nossa comunidade para com esse benfeitor.
A solidariedade e a gratidão, conforme reportadas anteriormente, eram-lhe características intrínsecas e sobejamente caras, de modo que não negou apoio, sobretudo material e financeiro, aos familiares e amigos de longas datas, que a ele recorreram quando passavam por circunstâncias desfavoráveis. Sua generosidade era patente, mas se fazia quase anonimamente quando atendia aos pleitos, intermediados por dignatários religiosos, líderes comunitários e outros filantropos, em favor de desvalidos.
Por fim, cabe ressaltar as expectativas da sociedade de que o leme desta nau empresarial, dantes conduzida por tão intrépido capitão de indústria, seja agora igualmente bem direcionada por seus filhos em águas plácidas, nos mesmos rumos traçados pelo antigo timoneiro, proporcionando idênticos benefícios sociais e econômicos à coletividade.
Marcelo Gurgel Carlos da Silva
Embora só agora esteja sendo publicado em "Linha do Tempo", este texto foi escrito em 2001, após o falecimento de Fernando Gurgel. No blog, existe outro texto sobre o perfilado, que pode ser acessado clicando sobre o link a seguir ► FERNANDO NOGUEIRA GURGEL

2 comentários:

Paulo Gurgel disse...

E-mail que recebi do jornalista JB Serra e Gurgel:
Conheci o Sr. Fernando Gurgel, na Siqueira Gurgel, no final da década de 50 e começo da de 60.
Não me parecia um simples vendedor da SG. Para mim, era o dono. Morava na rua atrás da SG.
O Usina Ceará, nessa época, tinha como sede uma casa grande na
Bezerra de Menezes, dentro da SG.
Não sei quem morou na casa grande.
Na José Bastos, ao lado da SG, tinha outra casa grande que dava para o Estádio Teófilo Gurgel e a Vila Teófilo Gurgel, na Duque de Caxias. Na casa, morou tia Dionísia, filha de Henrique Gurgel do Amaral Valente, irmão de Teófilo, casada com João de Souza, que era o administrador da SG.
Este o conheci e me deixava datilografar textos na área administrativa da SG, à noite. Lá fazia eu o Jornal Mural do Colégio Lourenço Filho, do meu saudoso Filgueiras Lima.
Surpreendi-me com os dois textos sobre o Fernando, quando descobri que não era filho do Teófilo, mas certamente de um outro irmão seu, de Senador Pompeu.
Preciso fazer o link do pai dele como os demais. Afinal, o pai de Teófilo foi casado três vezes, como está em meu site da família Gurgel do Amaral Valente, de Acopiara.
Teria tido filhos Teófilo Gurgel? Quais?
O pai de Fernando seria irmão de Teófilo?
Já contei que Teófilo e Henrique trabalharam juntos em Fortaleza
(Parangaba). Teófilo encontrou Diogo Siqueira e tocou a SG. Henrique foi fornecedor de secos¨molhados para os trabalhadores da Estrada de Ferro
Baturité, mas tarde Rede de Viação Cearense. Acompanhou a construção até Acopiara, então Lages, e lá ficou.
Se tiverem (você e Marcelo) alguma resposta, agradeço.
Afinal, somos pesquisadores dos nossos próprios passos.
Foi bom ter encontrado vocês.
Pode pôr isto como comentário em Linha do Tempo.
JB Serra e Gurgel

Paulo Gurgel disse...

Olá, JB.
Fernando Nogueira Gurgel, fundador da Mecesa, era o terceiro filho de Francisco Gurgel Valente (Chiquinho) com Dulce Nogueira Riquet.
Francisco, por sua vez, era o irmão mais velho de Antônio (Toinho), Claucídia, Almerinda (minha avó materna), José, Raimundo (Raimundinho) e Olímpia.
Fernando, por conseguinte, era sobrinho de José, um dos donos da SG.
Eram irmãos de Fernando: Adélia, Flávio e Fernanda.
Um abraço.